"Nada me preocupa". Trump desvaloriza manobras militares da China com fogo real à beira de Taiwan

O presidente dos EUA, Donald Trump, admite que o líder chinês, Xi Jinping, não o notificou sobre os exercícios que envolveram lançamentos de mísseis reais no Estreito de Taiwan.

Cristina Sambado - RTP /
Tsai Hsin-Han - Reuters

Donald Trump afirmou não estar preocupado com os exercícios militares com munições reais realizados pela China perto de Taiwan e que mantém uma ótima relação com o líder chinês Xi Jinping, que “não disse nada sobre o assunto”.

Os comentários do presidente norte-americano surgiram um dia após o início da simulação de ataque surpresa lançada pelo Exército de Libertação Popular (ELP), na segunda-feira, que continuou esta terça-feira com lançamentos de mísseis reais no Estreito de Taiwan.

O ELP afirmou ter mobilizado contratorpedeiros, fragatas, caças, bombardeiros, drones e mísseis de longo alcance “nas proximidades” de Taiwan na segunda-feira para testar “a coordenação ar-mar e a busca e neutralização precisa de alvos”, incluindo ataques a submarinos e outros alvos marítimos.


Crédito: Comando do Teatro Leste via Reuters

Pequim afirma que Taiwan é uma província chinesa e está a preparar-se para a anexar militarmente, com o objetivo de conseguir invadi-la até 2027, de acordo com informações dos serviços de informação norte-americanos de há alguns anos. Entretanto, utiliza uma série de formas de assédio e intimidação, militares e não militares, para convencer ou coagir Taiwan a aceitar a “reunificação pacífica”.
O Ministério da Defesa de Taiwan afirmou que, até à manhã de terça-feira, detetou pelo menos 14 navios da Marinha, 14 navios da Guarda Costeira, um balão de vigilância, 130 aviões de guerra e drones em redor de Taiwan, no âmbito do exercício que a China denominou “Missão Justiça 2025”.


O Exército Popular de Libertação (PLA) e os meios de comunicação social estatais chineses revelaram que estes exercícios se concentraram em simular um bloqueio dos principais portos de Taiwan e repelir “interferências estrangeiras externas”.

Questionado sobre os exercícios na segunda-feira, Trump disse que tem uma “ótima relação com o presidente Xi, e ele não me disse nada sobre isso”.

“Não acredito que ele vá fazer isso”, disse Trump, aparentemente referindo-se a uma invasão real. “Nada me preocupa.”
Os EUA são o principal apoiante de Taiwan na sua resistência aos planos de anexação de Pequim, mas a postura de Trump – especialmente durante o seu segundo mandato – tem sido inconsistente. Trump reuniu-se com Xi em outubro, mas disse que Taiwan “não foi mencionado”. Espera-se que visite Pequim para uma reunião mais formal no próximo ano.


Na manhã desta terça-feira, uma série de rockets reais foi vista a ser disparada a partir de Pingtan, uma região costeira chinesa junto à ilha principal de Taiwan. Pouco tempo depois, o Exército de Libertação Popular (ELP) declarou em comunicado: “Às 9h00 do dia 30 de dezembro, as forças terrestres do Comando do Teatro Oriental do ELP realizaram exercícios de tiro real de longo alcance nas águas a norte da ilha de Taiwan e obtiveram os efeitos desejados.”

Os exercícios chineses já levaram ao cancelamento de 76 voos domésticos, o que afetou cerca de seis mil passageiros, segundo as autoridades de Taiwan.

Pequim também parece estar a utilizar os exercícios para praticar ataques a alvos terrestres, como o sistema de rockets HIMARS, de fabrico norte-americano, afirmou à Reuters um funcionário de segurança de Taiwan. Trata-se de um sistema de artilharia altamente móvel com um alcance de cerca de 300 quilómetros que poderia atingir alvos costeiros no sul da China.

Os jornais chineses também destacaram o primeiro destacamento do navio de assalto anfíbio Tipo 075, uma embarcação pode lançar simultaneamente helicópteros de ataque, lanchas de desembarque, tanques anfíbios e veículos blindados.Cerca de 2,45 mil milhões e dólares em comércio passam pelo Estreito de Taiwan todos os anos, enquanto o espaço aéreo sobre a ilha serve como um corredor que liga a China, a segunda maior economia do mundo, aos mercados em rápido crescimento do Leste e Sudeste Asiático.

O Ministério da Defesa de Taiwan afirmou que os locais de impacto estavam “espalhados pela zona de 24 milhas náuticas de Taiwan”.

Wellington Koo afirmou que os exercícios desrespeitaram as normas internacionais e “visam claramente alcançar a guerra cognitiva, esgotar as capacidades de combate de Taiwan e criar divisão e conflito dentro da sociedade taiwanesa”.

Já o presidente de Taiwan, Lai Ching-te, afirmou esta terça-feira que a China não está a agir como uma potência mundial responsável. Taiwan defenderá a sua soberania, disse.

"Agiremos de forma responsável e não intensificaremos o conflito nem provocaremos disputas".

Os exercícios militares desta semana são os sextos e maiores a terem como alvo Taiwan desde 2022, quando grandes exercícios cercaram a ilha em retaliação pela visita da então presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi.

Estes exercícios requerem um planeamento extenso e geralmente fazem parte do treino geral, mas o Exército de Libertação Popular (ELP) associa-os frequentemente a atos percebidos como provocação. Esta semana, as autoridades chinesas e os meios de comunicação estatais citaram especificamente a recente aprovação pelo Governo dos EUA para uma venda recorde de armas no valor de 11 mil milhões de dólares a Taiwan.

Um ataque a Taiwan por parte de Pequim irá provavelmente envolver os EUA e, possivelmente, o Japão, de acordo com declarações recentes da primeira-ministra japonesa. Sanae Takaichi afirmou que as forças armadas japonesas provavelmente se envolveriam caso a China atacasse Taiwan, o que enfureceu Pequim.

Num discurso esta terça-feira, o ministro chinês dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi, afirmou: “Em resposta às contínuas provocações das forças pró independência em Taiwan e à venda em larga escala de armas americanas a Taiwan, devemos, naturalmente, opor-nos resolutamente e combatê-las com veemência”.


Wang indicou que os exercícios militares serviam também de mensagem ao Japão, cujos líderes, segundo ele, “desafiam abertamente a soberania territorial da China”.

Um editorial da agência estatal Xinhua afirmou que os exercícios eram “um claro lembrete para o Partido Democrático Progressista (DPP) de que a tendência de reunificação nacional é imparável e que a vontade do povo não pode ser desafiada”.

“As tentativas fantasiosas do DPP de procurar a ‘independência de Taiwan’ com o apoio dos EUA só aumentarão as tensões no Estreito de Taiwan e levarão os residentes da ilha à beira de conflitos”, lia-se no editorial.

Analistas sediados na China observaram, em declarações ao jornal britânico The Guardian, que os exercícios ocorreram quase imediatamente após as autoridades taiwanesas, incluindo o presidente da Câmara de Taipé, Chiang Wan-an, terem participado num fórum sobre “cidades gémeas” em Xangai.

O reitor do instituto de estudos internacionais da Universidade de Fudan, Xinbo Wu, afirmou que isto demonstra a "dupla abordagem da China continental" em relação a Taiwan, oferecendo incentivos e ameaças.

c/ agências 
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